terça-feira, 27 de julho de 2010

Aspectos Éticos dos Transplantes de Órgãos



Os transplantes de órgãos vem provocando inúmeros questionamentos éticos a cerca da origem, forma de obtenção do material a ser transplantado e tipo de procedimento a ser realizado. Quanto a origem, os órgãos podem ser oriundos de outras espécies animais ( xenotransplante), de seres humanos vivos (alotransplante intervivos) ou mortos (alotransplante de doador cadáver). Quanto a forma de obtenção, especificamente falando em órgãos oriundos de seres humanos, a questão mais importante é a do resguardo da voluntariedade e da espontaneidade no ato de doar órgãos, ou aceita que o bem comum está acima da vontade do indivíduo e permitir a apropriação dos órgãos de cadáveres ou que o indivíduo é proprietário do seu corpo e, desta forma, pode dispor do mesmo como melhor lhe aprouver. O tipo de procedimento também apresenta inúmeros questionamentos. Os transplantes de órgãos internos foram os primeiros, mas alguns transplantes já foram realizados com manifestação externa das partes transplantadas, como o transplante de mão e mais recentemente o transplante parcial de face.

A utilização de órgãos de outros animais em seres humanos vem atraindo a atenção de cientistas desde o início do século. Exemplo disto é o caso Baby Fae.

A obtenção de órgãos de doador vivo tem sido muito utilizada, ainda é útil, porém é igualmente questionável desde o ponto de vista ético. Este tipo de doação somente tem sido aceito quando existe relação de parentesco entre doador e receptor. A doação de órgãos por parte de amigos ou até mesmo de desconhecidos tem sido fortemente evitada. As questões envolvidas são a autonomia e a liberdade do doador ao dar seu consentimento e a avaliação de risco/benefício associada ao procedimento, especialmente com relação à não-maleficência (mutilação) do doador.

A utilização de órgãos de doadores cadáveres tem sido a solução mais promissora para o problema da demanda excessiva. O problema inicial foi o estabelecimento de critérios para caracterizar a morte do indivíduo doador. A mudança do critério cardiorrespiratório para o encefálico possibilitou um grande avanço neste sentido. Os critérios para a caracterização de morte encefálica foram propostos, no Brasil, pelo Conselho Federal de Medicina através daresolução CFM 1480/97. Na doação de órgãos por cadáver muda-se a discussão da origem para a forma de obtenção:doação voluntária, consentimento presumido, manifestação compulsória ou abordagem de mercado.

Em 16 de janeiro de 1997, foi aprovada , pelo Congresso Nacional, após uma longa discussão, a nova lei de transplantes ( Lei 9434/97), sancionada pelo Presidente da República em 4 de fevereiro de 1997, que altera a forma de obtenção para consentimento presumido. A legislação anteriormente vigente (Lei 8489/92 e o Decreto 879/93) estabeleciam o critério da doação voluntária. Em março de 2001 houve uma nova mudança, através da lei 10211, que dá plenos poderes para a família doar ou não os órgãos de cadáver. Todas as manifestações de vontade constantes em documentos foram tornadas sem efeito.

Ao longo de poucos anos, houve uma mudança muito grande na abordagem desta questão no Brasil . No período de 1968 a 1997 era válida a vontade do individuo, na sua ausência a família poderia se manifestar. A partir de 1997 houve a mudança para a possibilidade da utilização dos cadáveres sem a participação da família, salvo manifestação individual em contrário. Desde março de 2001, apenas a família tem poderes para permitir ou não a doação, sem que haja espaço legal para a manifestação do indivíduo. Recentemente foi apresentada uma proposta inusitada. Um projeto de lei, de junho de 2004, propõe a utilização intervivos de órgãos de condenados a penas superiores a 30 anos de reclusão.

A alocação dos órgãos para transplante, assim como de outros recursos escassos deve ser feita em dois estágios. O primeiro estágio deve ser realizado pela própria equipe de saúde, contemplando os critérios de elegibilidade, de probabilidade de sucesso e de progresso à ciência, visando a beneficência ampla. O segundo estágio, a ser realizada por um Comitê de Bioética, pode utilizar os critérios de igualdade de acesso, das probabilidades estatísticas envolvidas no caso, da necessidade de tratamento futuro, do valor social do indivíduo receptor, da dependência de outras pessoas, entre outros critérios mais.

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